Eu poderia começar este texto com dizeres de algum autor importante ligado a Biblioteconomia. Poderia ser um clássico como Ranganathan ou um contemporâneo como Waldomiro Vergueiro, Francisco das Chagas, Lancaster, ou ainda a ilustre Nair Kobashi, mas meu intuito neste texto é relatar dúvidas, critíca e deixar perguntas que ainda permeiam o meu universo de trabalho.
Somos preparados para o serviço essencial de bibliotecas, arquivos, centros de documentação, museus, entre outros tantos em que o bibliotecário, no cenário atual, está se encaixando e buscando seu espaço.
No entanto o texto tem que ser específico, não esqueçam que tudo deve ser limitado, para que o assunto possa ser melhor abordado, mais coerente. E não poderia ser diferente neste, afinal todos têm suas realidades, e a abordada aqui é a Biblioteca Universitária. Antes que algum especialista em língua portuguesa questione a escrita, deixo claro que a intenção em manter o termo “Biblioteca Universitária” em letras maiúsculas é para dar ênfase ao assunto.
Saímos da faculdade, como citado acima, prontos para o trabalho técnico, ou seja, catalogar, classificar, buscar informações, “poupar o tempo do leitor”, ser eficientes naquilo que fazemos. O que não nos ensinaram foi a ser gerentes, a ser gestor de pessoas, ser líder dentro de uma determinada instituição.
Alguns têm a sorte de ter dentro de si atitudes de líder e noções de gerenciamento, ou ainda terem tido essas experiências em outros ambientes que não o profissional. Outros por outro lado ficam aterrorizados quando se deparam com uma equipe que espera que ele seja capaz de conduzi-la. A Biblioteca Universitária é assim, principalmente as particulares. Os diretores têm procurado gerentes para suas bibliotecas, pessoas capazes de não somente classificar e catalogar itens, mas capazes de conduzir uma equipe, de resolver problemas e situações fora do ambiente técnico da biblioteca como um todo. Claro que esses gerentes tem que ser bibliotecários, com registros no CRB, para poder receber as comissões do MEC, outro aspecto que aterroriza os jovens bibliotecários, mas deixemos esse assunto para uma outra hora. O que inúmeras vezes presenciamos são jovens sem preparo para o mercado de trabalho, hoje, especialmente voltado para o ensino.
Por inúmeras razões os cursos de biblioteconomia espalhados pelo Brasil, não estão preparando os futuros biblioteconomistas para assumirem papeis de gerência. Claro, agora teremos inúmeros professores discordando disso, vão dizer que existem aulas de planejamento estratégico, gestão de biblioteca, e outras tantas que possam se justificar, na grade curricular. Deveriam, no entanto, ver a qualidade dessas aulas, e antes de dizerem que a instituição na qual trabalham não faz parte dessa camada, observem os ex-acadêmicos da instituição, observem onde eles estão e o trabalho que estão desempenhando. Talvez com essa análise possam fazer uma reflexão acerca da grade curricular do curso de biblioteconomia.
Tendo iniciado dessa forma, vamos ao que diz o título dessas linhas. Tenho 23 anos, sou formado pela Universidade Federal de Mato Grosso – Campus Universitário de Rondonópolis. O que isso quer dizer? É uma faculdade pública. O que isso representa? Greves ao longo dos quatro anos, que passadas as greves se tornam cinco. Pra que isso interessa? Para mostrar que isso tudo prejudica o aprendizado dos acadêmicos, que por sinal já estudam numa grade defasada.
Outro fato interessante e totalmente relevante, é o fato de termos bacharéis em biblioteconomia, que fazem mestrado, doutorado, pós doutorado. O que isso tem de especial? Uma parcela significativa desses profissionais se tornam professores. Ótimo (você pode pensar) agora não faltarão professores, de fato não faltarão pessoas que pensam ser professores. Pessoas cultas, sensacionais, mas que infelizmente não servem para ministrar aulas de uma determinada disciplina. Há uma diferença enorme em se adquirir conhecimento e repassar conhecimento. Nesse instante deve haver centenas deles lendo esse texto e com certeza dizendo frases do tipo: Os acadêmicos é que são desinteressados, nós preparamos nossas aulas com data show, retroprojetor, realizamos debates,entre outras coisas. Caro “professor”, os acadêmicos precisam de Professores, que pelo simples falar os faça refletir, os faça não ter vontade de não desgrudar os olhos dele. É desse profissional que o Brasil precisa, não de sanguessugas que viram um modo mais fácil de ganhar dinheiro sem muito esforço, sim, porque o tipo de individuo que descrevo aqui não passa disso. E olha que há uma camada bem grande desses.
Nossos anos na faculdade são repletos de brilho, esperança de uma carreira fantástica, certo? Ninguém te falou que a maioria dos órgãos da classe (biblioteconomia) não fazem seu trabalho de fiscalização não é mesmo? Mas isso você mesmo vai poder observar quando for ao mercado de trabalho, caso ainda seja acadêmico. Existe um documento do Governo Federal que deixa claro que toda biblioteca tem que ter um bibliotecário, detalhe, as próprias bibliotecas públicas muitas vezes não tem. O curioso é que se você não tem uma carteirinha do CRB não esta apto a trabalhar, mas se tem outro ocupando a vaga que por lei deveria ser sua, o órgão não está lá para autuar e fazer o que é de direito nosso.
Veja quantos assuntos permeiam o ambiente propicio para o desenvolvimento da atividade bibliotecária. Nós não temos sequer um piso salarial estipulado, que espécie de profissionais nós temos sido, que categoria é essa que não consegue sequer se organizar e reivindicar o que seria básico.
É, o curso de biblioteconomia deveria ser valorizado, com certeza esse é o anseio de todos nós bibliotecários. Mas nós também devemos fazer a nossa parte, cobrar dos órgãos responsáveis uma atuação mais séria, mais ética. A imagem do bibliotecário continua retrograda, é a figura de alguém mal-humorado, sentado atrás de uma mesa sem fazer nada, ou melhor, jogando paciência no computador. Uma figura deturpada pela própria imagem que a classe bibliotecária passou para a sociedade.
A relevância que o bibliotecário tem hoje está voltada à questão da obrigatoriedade imposta pelo MEC, muitas instituições não valorizam os bibliotecários, os tem como peças importantes de um jogo de xadrez, afinal alguém tem que proteger o rei.
Hoje aos 23 anos eu imagino que podemos mudar toda essa situação, não sou descrente das autoridades competentes, apenas acredito que hoje elas não tem desenvolvido um bom papel. Talvez seja o momento de uma reforma bibliotecária. O curso merece uma nova roupagem, uma nova visão da profissão. Os bibliotecários merecem ser reconhecido pelo trabalho que desempenham, não devem viver no anonimato, serem excluídos ou discriminados.
Uma profissão tão antiga, que passou por tantos momentos difíceis, que teve importantes conquistas, precisa acompanhar melhor as mudanças da sociedade contemporânea. Aliar novos conceitos, mudar paradigmas ser agente transformadora do meio onde atua, são qualidades que nós precisamos desenvolver. Nós precisamos ser notados, bem quistos, essenciais para a instituição. Está na hora dos bibliotecários se tornarem “a rainha do tabuleiro de xadrez” e mostrar quão importantes nós somos.
Você que está acomodado, sentado atrás de um computador, acreditando que está desempenhando um bom trabalho, comece a se preocupar porque as empresas estão precisando de empreendedores e se você não o for, eles encontrarão outro que possa ser.
Você acadêmico, que está prestes a sair da faculdade e ainda não sabe o que vai fazer, torne-se empreendedor, não fique alheio as transformações da sociedade, lute pelos seus direitos, peça salários justos e não se contente com migalhas que as instituições possam oferecer. Acredite no seu trabalho e desempenhe-o bem, seja gestor uma biblioteca, atue de forma criativa e mostre o seu trabalho.
23 anos e uma história começando, uma biblioteca para zelar, mostrar trabalho, criar, organizar, estimular e acreditar no que se faz. A Biblioteca Universitária é um caminho, mas talvez você prefira um outro horizonte, no entanto a fórmula é a mesma: Competência, seriedade, ética e trabalho. Que a próxima década da Biblioteconomia seja melhor do que esta que está terminando, que o horizonte da profissão seja claro e que os objetivos possam ser traçados.
Leonel Gandi
Coodenador das bibliotecas ULBRA/CEULJI e CEDUSP